André Ventura, o Chega e a política da mentira: pela verdade, contra o ódio

André Ventura e o Chega — que, com a ajuda cúmplice de grande parte da Comunicação Social, surgem todos os dias nas televisões — mostraram-se muito agitados e nervosos com as notícias da apresentação ao Ministério Público de requerimentos visando a sua extinção pelo Tribunal Constitucional. Redobraram assim nos únicos “argumentos” que conhecem, ou seja, os dos insultos mais boçais, das ameaças mais vis e das mentiras mais descaradas.

Ora, se aqueles devem ser vistos com atenção e rigor, mas sobretudo como uma honra para aqueles que são dessa forma visados e atacados, as falsidades mil vezes repetidas não podem deixar de continuar a ser, permanentemente e implacavelmente, desmascaradas.

As mentiras sobre os ciganos

André Ventura e o Chega passam a vida não só a insinuar como até a afirmar que os ciganos são pessoas que não trabalham porque não querem, que estão (tal como os imigrantes) ligados à criminalidade, que vivem à conta dos nossos subsídios, em especial à custa do Rendimento Social de Inserção (RSI), de centenas ou até de mais de um milhar de euros, montantes que receberiam mensalmente.

Ora, trata-se de uma perfeita mentira. A esmagadora maioria dos ciganos é muito pobre e também muito discriminada, desde logo no acesso ao emprego, porque basta alguém dizer que é cigano para praticamente ninguém lhe dar trabalho. Há aproximadamente 50 mil ciganos em Portugal, o que corresponde apenas a 0,5% de toda a população portuguesa. Mais de 95% dessa população cigana vive, de facto, abaixo do limiar da pobreza. E, mais do que isso — talvez exactamente por isso também —, a sua esperança de vida é de apenas cerca de 60 anos, muito abaixo dos 78 anos da esperança de vida do resto dos cidadãos.

Convém, por outro lado, aqui recordar igualmente, e repeti-lo à exaustão perante as contínuas falsidades do Chega, que o RSI representa, actualmente, cerca de 1% (apenas 1%!!) de toda a despesa da Segurança Social, e atingiu, em 30 de Julho de 2025, o número mais baixo de beneficiários, cerca de 172 mil, dos quais apenas 11.000 (ou seja, 6,4%) serão ciganos.

Por seu turno, o valor do RSI é de 242,23€ para o titular, 169,56€ para o outro elemento do agregado familiar que seja maior de idade, e 121,52€ por cada menor de idade. E do montante apurado do RSI abstractamente aplicável àquela família é sempre descontado o valor total de outros rendimentos que a mesma família porventura tenha. Assim, um casal com 2 filhos menores, em que um dos progenitores receba uma qualquer remuneração de 400€, vai apenas receber 242,23€ + 169,56€ + 121,52€ + 121,52€ = 654,83€ – 400,00€ = 254,83€.

E, mais do que isso, a atribuição de tal RSI depende do preenchimento de toda uma série de requisitos legais (por exemplo, estar inscrito no Centro de Emprego se estiver desempregado e tiver condições para trabalhar, bem como autorizar a Segurança Social a aceder a todas as informações relevantes para a avaliação da sua situação sócio-económica), e depende também da assinatura, com a mesma Segurança Social, de um “contrato de reinserção social”, com diversas obrigações cujo incumprimento conduz à retirada do dito subsídio, sendo ainda certo que quem ficar desempregado, mesmo que o despedimento tenha sido sem justa causa, só pode pedir o RSI um ano depois de ter sido despedido. E este é o regime que se aplica a todos, sem excepções para ninguém.

Por seu lado, o subsídio de desemprego – outro dos tais subsídios de que Ventura e companhia acusam os ciganos (e também os imigrantes) de receberem por nada fazerem e viverem assim à custa dos portugueses de origem – é apenas atribuído às pessoas que, havendo trabalhado nos últimos dois anos, tenham efectuado descontos para a Segurança Social, pelo menos durante 12 meses. E isto aplica-se a todos: portugueses de origem, naturalizados ou imigrantes estrangeiros!

As mentiras sobre os imigrantes

Acresce que, aquilo que os números oficiais relativos a 2024 demonstram é que os imigrantes fizeram, nesse ano, 3.645 milhões de euros de descontos para a Segurança Social portuguesa e receberam dessa apenas pouco mais de 700 milhões de euros, ou seja, receberam de subsídios apenas um quinto daquilo que descontaram! Isto, a ponto de, sem as suas contribuições, as receitas globais da mesma Segurança Social terem um decréscimo de 12,4%, sendo a consequência disso um resultado líquido negativo de 1.820 milhões de euros!

Por outro lado, de acordo com os dados oficiais (do Relatório Anual de Segurança Interna), não só a criminalidade, em geral, não tem aumentado – antes tem diminuído – nos últimos 10 anos em Portugal, como não há qualquer espécie de relação – tal como o afirmou, clara e publicamente, o próprio Director Nacional da Polícia Judiciária – muito menos especial ou minimamente significativa, entre o aumento do número de comunidades imigrantes e o incremento dos níveis da criminalidade violenta (que terá crescido 3% em 2024, mas que está muito abaixo dos níveis de há uma década).

No que diz respeito à afirmação, mil vezes repetida, de que os imigrantes estão a roubar os empregos aos portugueses, a sua falsidade é também total. Não só Portugal tem actualmente níveis históricos de população empregada (5,3 milhões de trabalhadores) e de desemprego (5,8% de taxa oficial), como os imigrantes estão essencialmente a trabalhar em sectores (como a agricultura intensiva, os estafetas, as limpezas, a restauração e a construção civil) onde há uma grande falta de mão-de-obra disponível, e sempre por condições, designadamente salariais, e também de habitação e alimentação, absolutamente miseráveis, inclusive abaixo do salário mínimo nacional, constituindo assim uma extraordinária oportunidade de lucros e de negócios para patrões, especuladores e traficantes de mão-de-obra.

A mentira da “grande substituição”

Finalmente, e quanto a pedidos de nacionalidade, em 2025, Portugal tinha 515.334 desses pedidos pendentes de decisão. Do total de 1,5 milhões de pedidos que deram entrada nos últimos anos, 64% são pedidos de atribuição de nacionalidade: 

a) filhos de pai ou mãe portugueses nascidos no estrangeiro; 

b) filhos de pais estrangeiros nascidos em Portugal, mas (somente) desde que o pai ou a mãe tenha nascido e seja residente em Portugal; 

c) crianças nascidas em Portugal e que não tenham direito a outra nacionalidade.

Isto é, a grande maioria desses pedidos de nacionalidade é de pessoas com muito fortes ligações ao nosso país.

Por seu turno, dos 515334 pedidos pendentes:

a) 31 % (a maior percentagem) são de descendentes de judeus sefarditas (cuja lei foi alterada em 2022); 

b) 27 % são de filhos e netos de portugueses; 

c) 20 % são de pessoas que pedem a naturalização após 5 anos de residência em Portugal.

Para além disso, apesar do grande aumento do número de pedidos, o número de novos titulares da nacionalidade portuguesa manteve-se constante, pelo que a ideia de uma autêntica avalanche de novos titulares da nacionalidade portuguesa é, também ela, absolutamente falsa.

E assim, a verdade é que a teoria xenófoba da “grande substituição” (do tipo “qualquer dia os estrangeiros são bem mais do que os portugueses”), difundida e propagandeada abertamente por André Ventura e por Passos Coelho, mas também, mais subtilmente, pelo Ministro Leitão Amaro, o que levou a que a AD aceitasse fazer de “barriga de aluguer” do Chega e das suas atoardas racistas, não tem, também ela, qualquer correspondência com a verdade dos factos.

Cartazes xenófobos e racistas: o que disse a CNE

Outra das mentiras recentes de André Ventura (lastimavelmente logo propalada por praticamente toda a comunicação social) foi produzida a propósito dos cartazes xenófobos e racistas dirigidos aos ciganos e aos cidadãos do Bangladesh e consistiu em afirmar que a Comissão Nacional de Eleições teria decidido e declarado que os ditos cartazes não são ilegais e, assim, teria confirmado a posição de Ventura e do Chega.

Mas tal não é, de todo, verdade! Com efeito, aquilo que a CNE – tal como, aliás, informou os mais de 400 cidadãos que lhe apresentaram queixas – foi ter o entendimento de que:

“(…) 2. Note-se que a eleição do Presidente da República, a ocorrer previsivelmente na segunda metade do mês de Janeiro de 2026, ainda não se encontra oficialmente marcada, pelo que a CNE não tem competência para intervir nesta matéria fora do período eleitoral.

(…)

4.2. Assim, o amplo domínio de proteção da liberdade de expressão terá a sua fronteira quando possa pôr em causa o conteúdo essencial de outro direito ou atingir intoleravelmente a moral social ou os valores e princípios fundamentais da ordem constitucional.

(…)

5.1. As mensagens políticas constantes dos cartazes fazem referência expressa e concreta a um grupo de pessoas com base na sua origem e a um outro grupo com base na sua etnia.

6. Face ao exposto, a Comissão delibera remeter as queixas rececionadas ao Ministério Público, para apreciar e apurar da prática de algum ilícito penal.”

Em suma, a CNE não declarou nem decidiu, de todo, que não via qualquer ilícito nos cartazes, como Ventura repetidamente afirmou, designadamente na entrevista ao Canal Now a 07/11, e as hostes do Chega reproduziram à exaustão. Pelo contrário, considerou, bem ou mal, que, não tendo ainda começado a campanha eleitoral, não tem competência legal para intervir nesta fase. Porém, atendendo a que os cartazes fazem referência expressa e concreta a grupos sociais, podendo por isso constituir ilícito criminal, remeteu as queixas para a entidade competente, isto é, o Ministério Público.

A verdade sobre a extinção do Chega

Perante a denúncia ao Ministério Público de que o Partido Chega estava há mais de 6 anos sem apresentar, como é sua obrigação legal, uma relação actualizada dos titulares dos órgãos nacionais – o que constitui, nos termos do art.º 18.º, n.º 1, al. c), da Lei dos Partidos Políticos (Lei Orgânica n.º 2/2023), incontornável causa da sua extinção, a requerimento do Ministério Público –, Ventura e o Chega vieram dizer que tal seria uma mentira, porquanto (e até existiria um ofício do Tribunal Constitucional) teriam, em 24/02/23, junto daquele Tribunal, procedido à apresentação da lista dos membros eleitos para os órgãos nacionais na V Convenção Nacional, realizada em Santarém nos dias 27, 28 e 29/01/23, e que o Tribunal Constitucional até teria, por despacho do seu Presidente de 14/03/23, procedido à anotação de tal lista.

Só que… André Ventura e o Chega ocultaram propositadamente da opinião pública que as deliberações dessa V Convenção – e, logo, as referidas eleições dos ditos titulares – foram declaradas inválidas pelo Acórdão n.º 707/2024 do Tribunal Constitucional, proferido em Outubro de 2024, pelo que a dita lista, bem como a respectiva comunicação e a respectiva anotação, são nulas e de nenhum efeito, tudo se passando como se nunca tivessem ocorrido. E, assim, a causa legal de extinção do Chega mantém-se intacta!

André Ventura e o Chega, obviamente, sabem bem de tudo isto, até porque foram formalmente notificados desse Acórdão, como, aliás, dos demais Acórdãos que anularam, para além das deliberações da referida V Convenção, também as das II, III, IV e VI Convenções. Mas, na ânsia de ocultar as suas ilegalidades e de caluniar e procurar desacreditar quem as denunciou, não hesitam, ainda uma vez mais, em mentir!

Quem defende e apoia ideias racistas e fascistas, racista e fascista é!

Confrontados com o requerimento da sua extinção (imposta pelo art.º 46.º, n.º 4, da Constituição), Ventura e o Chega juram, a pés juntos e a todo o tempo, que não são nem racistas nem fascistas. Mas, mostrando bem a falsidade dessas juras, o vice-presidente do Chega e deputado, Pedro Frazão, gravou uma mensagem em vídeo que foi projectada durante o Congresso do movimento neo-nazi “Reconquista”, realizado na Maia a 08/11/2025, na qual proferiu estas frases tão significativas quanto fascistóides e racistas:

“O Chega, com aliados como vós, está aqui para lembrar a todos que a defesa de Portugal passa também pela defesa da nossa cultura, das nossas famílias e da nossa identidade cristã portuguesa.”

“O maior de todos (os desafios) é garantir o futuro do nosso Povo através da remigração.”

Desta forma, o Chega manifesta publicamente e sem qualquer restrição o seu apoio a uma das principais propostas e iniciativas desse movimento neonazi: a expulsão forçada de imigrantes não brancos, mesmo que tenham residência legal ou sejam descendentes de segunda geração, para os seus países de origem.

Note-se que o Reconquista é um movimento assumidamente racista, supremacista e neo-nazi, cujo líder, Afonso Gonçalves, já foi detido quatro vezes por crime de ódio, e que enche as redes sociais com permanentes e inflamadas afirmações racistas, islamofóbicas, homofóbicas e machistas (defendendo mesmo que as mulheres não deveriam poder votar por não terem inteligência para tal) e espalhando brutais (e ilegais e inconstitucionais) incitamentos ao ódio e à violência.

Foi neste Congresso de dia 8/11 – em que houve oradores a defender abertamente a “pureza racial” e a “caça aos imigrantes” – que o Chega participou, com vários dos seus elementos presentes, e em que o seu vice-presidente enviou, para exibição, o dito vídeo em que apelidava significativamente de “aliados” e de “amigos” os membros do Reconquista.

E é por tudo isto que já disse, e aqui e agora reafirmo, que essa organização política e os seus dirigentes, que fazem das ameaças, calúnias e das mentiras mais descaradas o seu modo de vida, não são apenas um caso de (má) Política: são também já um “caso (e grave) de polícia”.

António Garcia Pereira

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