Desde que nasci, e isso foi há 72 anos — justamente um ano depois em que as Nações Unidas (1948) retiraram o império britânico da administração do território para ser entregue às organizações judias com a demarcação dos territórios pertencentes aos palestinianos –, que o território da Palestina, é palco de combates entre judeus sionistas e palestinianos. A bem dizer, logo que os Impérios Centrais foram vencidos e a Palestina (com a Jordânia) passou a ser um mandato britânico, a questão palestiniana entrou na ordem do dia.
Aliás, já em 1917, a famigerada “Declaração Balfour” tinha aberto a hipótese de criar na Palestina um “Lar Nacional Judaico”.
Tal decisão, arrancada ao Ministro Britânico, por um dos grandes e milionários líderes da causa judaica, tinha, como pano de fundo, a lembrança, vivíssima, de inúmeros “pogroms” levados a cabo na Polónia e na Rússia, bem como um poderoso sentimento anti-semita que, em França, teve o seu auge com a questão Dreyfus.
Deve salientar-se que, alguns iluminados espíritos europeus tocados pela piedade, já tinham imaginado outros lares nacionais para os judeus, particularmente Madagáscar e/ou a Namíbia, ao Sul de Angola. Ou, por outra palavras, esta gente “amava os judeus” desde que estes estivessem longe… o mais longe possível.
Ainda com o mandato britânico na Palestina, o movimento sionista começou a propagandear um regresso às origens, mesmo se a esmagadora maioria dos judeus europeus pouco ou mesmo nada tivesse a ver com raízes nos territórios históricos de ISRA HELL.
A História regista que a diáspora sefardita conduziu os judeus para a península Ibérica, para os territórios da Arábia e para o Magrebe. Mais tarde, com a expulsão dos judeus peninsulares, se é verdade que alguns, uma minoria se dirigiram para o norte da Europa ou para Veneza, a grande maioria espalhou-se por territórios muçulmanos onde, de resto, foram bem recebidos. A Turquia e seus territórios (o norte da actual Grécia mais precisamente), a Tunisia e Marrocos, foram eventualmente os maiores focos de recepção dessa comunidade em fuga.
A História tem destas ironias: os que depois foram considerados “inimigos” de Israel foram durante séculos os seus melhores hospedeiros!
Voltando ao século XX, entre guerras, verifica-se que nos reconstituídos países de Leste (Lituânia, Polónia, Checo- Eslováquia) se reacenderam, à luz de violentos nacionalismos, fortes oposições à presença de judeus que eram olhados como uma peste. O mesmo se passou na Ucrânia, aliás. Nas suas “Crónicas Berlinenses”, JOSEPH ROTH descreve a “invasão” pacífica mas constrangedora, de multidões judias vindas dos “shetls” da Europa Central e deslocadas pela guerra e sobretudo pelas novas perseguições. Amontoados em Berlim, tentando chegar a um porto que os levasse para o novo mundo, miseráveis eram a contra-imagem das elites judias que aliás se tinham notabilizado nas artes e nas letras. Acrescente -se que inúmeros judeus serviram honrosamente nos exércitos alemão e austríaco e também por isso nunca imaginaram que poucos anos depois o seu nacionalismo alemão fosse posto em causa.
O crescente sentimento anti-sionista fez com que a pequena mas persistente corrida askenaze para a Palestina aumentasse. Mesmo se os ingleses, não fossem entusiastas da crescente presença de colonos judeus, a verdade é que estes pouco a pouco foram adquirindo terras, criando estruturas pré nacionais que foram imediatamente denunciadas pelos líderes árabes e sobretudo pelo Grande Mufti de Jerusalém.
As organizações judias palestinianas organizaram uma milícia (que daria origem ao futuro exército israelita) e, ao mesmo tempo, criaram vários grupos terroristas que provocaram fortíssimos problemas aos ingleses, como por exemplo o atentado do “Hotel King David”.
Portanto, antes da proclamação de Independência, já o ambiente na terra palestina era o de guerra civil larvar.
A partir de 1948, o Estado de Israel levou a cabo, por boas ou más razões, um conjunto de campanhas em resposta às ineficazes tentativas de invasão levadas a cabo pelo Egipto, Síria, Iraque e Jordânia.
Israel aproveitou para unilateralmente rectificar as fronteiras inacreditáveis do plano de partição e, pouco a pouco, foi aumentando o seu território sobretudo à custa da Jordânia. A cada desastrada campanha árabe, o exército israelita mais bem armado com armas vindas de várias origens através do tráfico organizado por eles, e por isso também mais bem preparado, lutando por objectivos claros e fundamentais — o de alargamento de territórios, foi-se apoderando de mais território e expulsando multidões de camponeses árabes apanhados entre dois fogos. A diáspora forçada árabe, sobretudo para o Líbano (onde num momento de invasão israelita foram chacinados aos milhares nos miseráveis campos de refugiados onde viviam) e para a Jordânia, teve origem logo em 1948 com a operação “Vassoura de Ferro”. A ideia era “limpar” os territórios de habitantes árabes com o pretexto de que presumivelmente poderiam fazer causa comum com os invasores.
Todavia, a partir de meados dos anos 60, Israel assumiu sem pudor o papel de ocupante de extensas regiões que jamais tinham feito parte do reino de Salomão. E continuou até à ocupação dos montes Golan e da parte árabe de Jerusalém. Neste último caso, a ocupação israelita reveste-se de uma violência feroz e tem uma única finalidade: expulsar os habitantes árabes do que estes consideram a sua “terceira maior cidade santa”.
Convém aclarar que, do lado árabe, com raras e contadas excepções, houve tentativas de diálogo recusadas pelos judeus radicais e que se verifica até hoje. Desde então avolumou-se a propaganda dos grupos extremistas, a sua actuação terrorista (basta lembrar Munique) não se baseava em qualquer ideia de proteger o povo árabe humilde ou a minoria árabe israelita.
Actualmente, um número significativo de países muçulmanos, sobretudo Sunitas, entendeu reconhecer Israel pela mão de Trump, da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes. Não que gostem de judeus, de maneira nenhuma, mas sobretudo odeiam Chiitas e o Irão. Estes, entretanto, criaram um Estado paralelo no Líbano e em Gaza e levam uma ineficiente “guerra santa” a cabo. As vítimas como se viu, se vê e se verá são sempre mais civis árabes mortos, obrigados a viver cada vez mais miseravelmente sobretudo em Gaza. Na Cisjordânia, Israel cria a ocupação impunemente e contra qualquer regra de direito internacional, de colónias que pouco a pouco vão asfixiando o que resta de um governo autónomo palestiniano.
Isto não é tudo, mas é uma tentativa de descrever resumidamente uma guerra que levará 100 anos e que, mesmo sem a proporção de outras, traz em si a criminosa e clara vontade dos sionistas de continuar levar a cabo um genocídio silencioso e criminosamente muito eficiente.
Aqui, “não vítimas” não serão outros senão os desgraçados apanhados pelas bombas. Em contrapartida há culpados, de todas as origens e religiões. E estes são os que até ao momento vão vencendo.
Mesmo quando o tal “povo escolhido por Deus” (que porra de Deus é este que escolhe gente para matar?) como proclama o regime assassino dos sionistas, morre a defender ISRA HELL — ou os que tombam pela causa palestiniana e que, em boa verdade nunca saíram da sua terra secular, ao contrário dos judeus que emigraram séculos antes para a Europa e outras partes do mundo e que regressaram em meados do Séc. XX para ocupar pela força das armas uma grande parte dos territórios onde nunca viveram e nunca lhes pertenceu e nos quais os palestinianos sempre viveram em paz.
Telmo Vaz Pereira
NR: Texto publicado originalmente na página Facebook de Telmo Vaz Pereira
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