Posso falar sobre o Cristiano?
Não sei nada de futebol nem de futebolistas por isso não me atrevo a opiniar sobre o desporto.
Deixo a minha irrelevante opinião (tenho esse direito), sobre a percepção superficial que tenho da pessoa pública, privada e secreta de um ser humano sobre o qual já se escreveu tudo. É a personagem que me interessa, por ser fascinante.
Por curiosidade com tudo o que se relaciona com a natureza humana. Porque conto histórias, e as histórias são obrigatoriamente sobre nós.
Todos temos essas personagens (pública, privada e secreta) e desempenhamos os papéis de acordo com o que a vida nos pede/exige.
Uma história relativamente comum, de um jovem que nasceu sem meios, no meio de nada, num ambiente desfavorável. O nada e o vazio seriam a sua vida. Como com Pelé.
Podiam ambos ser personagens de Dickens com as suas personas públicas, privadas e secretas até alguém de olhar afinado os ver.
Escondido, trazia um talento tão valioso quanto a mina de esmeraldas (estas últimas valem mais que diamantes), como com o privilégio herdado pelo Musk. Semelhante história com Pelé.
Recebeu também amor materno, ela própria uma esmeralda em bruto, que o nutriu o melhor que soube. Percebe-se este facto pelo agradecimento humilde e reverencial que CR7 tem constantemente para com Dona Dolores. Como recebeu e deu Pelé.
A natureza deu-lhe o que o ambiente não favorecia. Junte-se o pedaço de calor humano que recebeu de quem o viu e o rapaz fez-se grande.
Com a descoberta do seu talento, Cristiano desabrochou como a estrelícia reginae da Madeira – uma rainha que produz flor todo o ano.
Um rei que ganhou o título por mérito. Nunca o vi jogar, porém afirmo porque “ouvi os experts dizer”. Como com Pelé.
Pelé no Brasil transpondo fronteiras, sem nunca ter jogado em equipas fora do seu país, naqueles outros tempos, torna-se tesouro nacional e Rei no mundo.
Com o florescimento, Cristiano foi desenvolvendo também a inteligência que o prepararia para aos 37 anos, em final de uma carreira estrelícia reginae, tendo conquistado o prestígio do topo do mundo junto dos melhores atletas da humanidade, ouvi dizer que assinou por quem lhe ofereceu um montante ao qual poucos mortais têm acesso, sequer à compreensão do valor. Merece-o, claro.
Precisa desse dinheiro o enorme CR7 que saiu da ilha para ver o topo do Everest? Claro que não. Ninguém precisa.
Vamos todos morrer e o livro de cheques e a atm ficam cá na terra.
Perguntem ao Pelé e ao Maradona.
Tal como Musk (e outros neste patamar) Cristiano desenvolveu características narcisistas, e estas catapultam o amor ao dinheiro e ao poder.
E claro, ao controlo da história que contam a si e aos outros.
O dinheiro comprou a mancha que se colou à sua vida sexual secreta e se veio a tornar pública, numa noite louca que aconteceu em Las Vegas, no início da carreira mas que não ficou em Vegas.
Ou como com Pelé e a filha que morreu a chamar o pai, sem que ele a tivesse reconhecido. Contam rumores que Pelé só morreu depois de ter sido visitado pelo neto, filho desta filha, para receber o perdão deste.
Quem sabe Cristiano comprou os rumores de outra vida mais secreta ainda. Porque os possantes jogadores de futebol não nasceram para ser livremente homossexuais, se o forem. E obrigar a viver no armário não é saudável para a saúde de ninguém. Desse rumor a personagem pública não se livra.
Como Pelé não se livra do rumor de “womanizer”. Podia ter as mulheres que quisesse, e tinha. Talvez nunca saibamos nunca o que fez na sua vida secreta relativamente a este assunto. Era fácil encobrir e estender o tapete a comportamentos sujos para com mulheres. Como algumas acusaram mais tarde, Diego Maradona.
Se as histórias secretas que pagou para abafar com o seu dinheiro forem reais, o seu personagem secreto será mastigado por si próprio. Refiro-me ao Cristiano. Pelé e Maradona já acertaram as contas.
Ao Cristiano, o dinheiro trouxe-lhe o conforto da opulência que roça o exibicionismo obsceno, de um poder que se torna necessário quase como uma adicção, quando os ouvimos gritar no silêncio “eu estou aqui”, vejam-me, sou um fruto apetecível”.
Nós vemos e gostamos de ti Cristiano, e respeitamos tudo o que tens para dar, e já deste, excepto eu que sou ignorante e nunca te vi jogar. Só ouço e leio. Porque só me interessam as personagens.
A família directa só se fosse estúpida é que não o apoiava até ao infinito e mais além por isso nem entram mais do que isto, neste texto.
Para reforçar a obscenidade, um facto sobre riqueza – a Georgina não ofereceu mais um RR ao Cristiano, foi sim a mesada que recebe fruto do trabalho do Cristiano, que o pagou.
Poderia Cristiano, ser só a pessoa pública que conhecemos como simples e árduo trabalhador, talentosíssimo e que distribui alguma da sua riqueza?
Poderia ser agora, no final da carreira, só a pessoa privada que goza os lucros do talentos, numa vida de negócios diversificada, como já é a dele?
Poderia ir jogar para o Sporting só pelo prazer de jogar à bola e acabar a carreira no clube que o lançou e ser só feliz?
Ou escolher outra coisa qualquer que só a ele interessa e diz respeito.
Poder podia, e é aqui que eu desconfio. Aqui entra de novo a minha mente distorcida a analisar personagens com um grau de narcisismo.
Ronaldo prefere dar-se aos Árabes da Arábia Saudita. Adorado e a viver com a jovem mulher e os filhos dentro de uma bolha de reclusão? Sim, a Gio não poderá andar à vontade pelas ruas de Riad naquele país de monarquia absolutista, que bombardeia o Iémen há anos, entre outras coisas com pouca gravidade.
Tenho alguma coisa com isso? Claro que não. Política e futebol não se misturam…Ou deveriam?
No final das contas o que conta é a adoração a um ídolo.
Como Cristiano é uma figura pública sou mais uma a analisar a personagem pública que com talento, inteligência e dinheiro estruturou as personagens privada e secreta.
Todas são vencedoras. Como Pelé fez.
O pormenor que me parece saltar na escolha, está ao nível de escolha similar à de Musk – o de se achar tão privilegiado quanto no direito de nunca perder poder nem dinheiro.
Hamlet criou personagens com esta dimensão de grandiosidade e narcisismo.
Imaginemos que a personagem privada esperava (porque pode), um convite para jogar num clube de prestígio, apenas pelo prestígio de arrumar as chuteiras no cabide certo.
No seu lugar saiu-lhe a rifa das arábias – trazendo mais uns Rolls Royce para a colecção a juntar-se a um jumbo, quem sabe.
Talvez esteja a perder a fineza da estrelícia reginae da sua trabalhadora inteligência.
A personagem secreta pergunta-lhe – “Para quê? Já provaste ser capaz de fazer investimentos inteligentes. Já produziste para todos os anos da tua vida e asseguraste as vidas de gerações vindouras. Vais comprar ao Musk viagens ao espaço? Comprar uma rede social? Jogares para o Santos e tornares-te maior que Pelé? Ou talvez te lembres de comprar a tua Ilha num gesto de extravagância e ficar por lá a produzir rum “captain rumnaldo”, ou estás a compensar, caindo nas mãos de Narciso e fugindo de ti ”…
O que falta a este personagem Dickinsiano, na estrelícia da vida, que nada mais precisa provar, seja a quem for?
“Aqui na terra já não há mais nada a conseguir. Agora é só viver”, diz-lhe a personagem privada.
Quer-me parecer que tanto a sua personagem pública, quanto a privada quanto a secreta perderam-se e alimentam conjuntamente um ego no panteão dos egos ilimitados, tal como Musk, nunca reconheceram sequer o céu como um limite.
Se for na direcção criativa é perfeito – basta pensar em Beethoven que traduziu toda a sua genialidade até aos trinta anos.
Se for por dinheiro, controlo, poder e adoração, pode-se tornar num drama para a personagem que for mais sensível e estiver descompensada.
Pode vir a causar distúrbios como nos bons dramas sobre a natureza humana.
Um ano das arábias para todos, incluindo os que não receberam contratos.
Anabela Ferreira
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