Com a terciarização da economia, o conceito de classe ter-se-á extinguido, segundo alguns, tornando irrelevantes as relações na esfera produtiva. Dificilmente se consegue incluir um individuo numa das classes sociais oriundas da era industrial. Os estilos de vida passaram a orientar-se por padrões pessoais, afinidades ou opiniões, substituindo estes padrões a relação rígida entre a classe social e um estilo de vida. Na política, os partidos portugueses tornaram-se transversais a um conjunto difuso de interesses e de eleitores. A cultura democratizou-se com a tecnologia. Alguns sociólogos afirmaram que existem efetivamente classes, mas remeteram-nas para a categoria de “zombies”, ou seja, inoperacionais, não tendo qualquer influência no percurso do indivíduo.
Porém, na opinião de muitos sociólogos e economistas, as classes não desapareceram. De fato, a estratificação ocorre ainda, mas agora através de uma capitalização efetuada pelo individuo na dimensão económica e cultural. As duas dimensões estão interligadas e são interdependentes. Estes dois eixos de estratificação social são amplamente definidos por via familiar, sobretudo numa época onde os rendimentos dos portugueses perderam e continuam a perder peso diante do capital.
Através do capital económico e cultural dos progenitores, os novos portugueses se enquadraram nos estratos sociais “new age”. Se do ponto de vista económico, a transmissão via familiar de capital e de bens corpóreos está pré-determinada, na transmissão cultural pode ainda ocorrer a mobilidade – dado que no espetro político português não está bem definida uma relação política favorável, ou não, ao progresso e à consequente distribuição da riqueza produzida. Aliás, o desinteresse – ou esvaziamento cívico premeditado, ou não – pelos atuais partidos políticos tornou-os corporativos ou, numa visão mais arriscada, oligarquias impenetráveis.
Logo resta a via cultural – educação, ambiente familiar ou comunitário, valores e crenças humanísticas – como a única variável disponível à vontade dos indivíduos. Essa variável tem sido e continuará a ser o último campo de batalha destes novos tempos, entre os dois grandes grupos de atores sociais: os privilegiados, obviamente conservadores, e os desprivilegiados, obviamente progressistas ou em última análise e sem alternativa em vista, apoiantes de vias mais radicais que levem a alteração das condições políticas fundamentais.
Aos desprivilegiados resta-lhes estudar, criar uma rede de relações sociais que aumentem o capital cultural e continuamente elevar o seu nível de abstração com o intuito de analisar de forma mais clara e sustentada os riscos e as oportunidades que surgem naturalmente na vida de cada homem ou mulher. Aos privilegiados cabe-lhes a missão de confundir e desorientar os primeiros, na sua busca pelo “Santo Graal” da mobilidade social: o capital cultural.
Luís Palma Gomes
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