
É tempo de tomar decisões e escolher caminhos. Estamos a chegar a um ponto de não retorno, um momento decisivo, queremos um país que avance ou queremos continuar a brincar as governos e aos partidos. A 18 de maio vamos às urnas, num clima de desconfiança, desilusão e expectativa contida. Está muita coisa em jogo, não é apenas a composição da Assembleia da República mas sim a garantia duma estabilidade que é necessária para que possamos corrigir os problemas que a nossa sociedade enfrenta. Mais que uma estabilidade uma garantia de que o trabalho feito no decurso duma legislatura não é destruído num novo ciclo político. Temos de conquistar a capacidade de encontrar ou reencontrar um rumo colectivo, com previsível estabilidade institucional e ambiciosamente reformista.
É quase garantido que destas eleições sairá uma maioria relativa. Nem o Partido Socialista de Pedro Nuno Santos, nem a Aliança Democrática de Luis Montenegro alcançarão os 116 deputados que lhes garantiriam governar sozinhos. O Chega elegendo mais ou menos deputados que na anterior legislatura será a terceira força política, com toda a destabilização democrática e risco para as instituições que isso acarreta. Os partidos mais pequenos (IL, Livre, BE, PAN e CDU) não terão peso suficiente para ancorar qualquer solução sólida de governação.
Torna-se, não só legítimo, mas fundamental, defender abertamente uma outra solução política, há muito comentado em surdina nos bastidores mas que poucos têm coragem de enunciar. A formação de um governo de Bloco Central. Um pacto entre os dois principais partidos pilares da democracia portuguesa (PS e PSD). Uma solução que assegure não apenas a governação do país, mas a sua transformação estrutural. Um governo patriótico, reformista, centrado na estabilidade e orientado para um programa de legislatura que rompa com o ciclo de improvisação recente.
Com a saída da Troika, Portugal durante quase uma década viveu uma “aparente normalidade”. A “geringonça” de 2015 trouxe inovação política e estabilidade inicial, mas revelou fragilidades na capacidade de concretizar reformas estruturais. O Governo absoluto do PS em 2022 prometia eficiência, mas colapsou sob o peso da concentração de poder, das alegadas fragilidades éticas e da erosão da confiança institucional.
A dissolução do Parlamento pelo Presidente da República, mesmo que constitucionalmente legítima, precipitou eleições num contexto volátil e polarizado e atirou o país para a beira do abismo, um país sem condições de governabilidade. A sucessão de sondagens confirma um cenário, nenhum partido poderá governar sem compromissos difíceis, e qualquer solução que exclua um entendimento entre PS e PSD dependerá ou de alianças forçadas com o populismo, ou de governos minoritários altamente instáveis.
Com esta realidade evidente, insistir em repetir uma alternância sem maioria é uma forma sofisticada de paralisar e comprometer irremediavelmente o nosso futuro. Portugal não pode continuar a viver entre governos frágeis, moções de censura, moções de confiança, jogadas e golpes palacianos e ameaças de dissolução recorrente.
Um Bloco Central não deve é uma aliança de sobrevivência, mas um pacto de responsabilidade nacional. PS e PSD, juntos, representam mais de 60% do eleitorado e refletem uma maioria política moderada, europeísta e reformista. As suas diferenças ideológicas são reais e saudáveis, mas não intransponíveis, sobretudo quando estão em causa os interesses superiores do país.
É necessário apresentar um acordo programático claro, assente num calendário legislativo ambicioso, com metas partilhadas e compromissos blindados. Um pacto que garanta:
– Estabilidade por quatro anos, afastando a ameaça constante de colapsos parlamentares.
– Reformas estruturais em áreas críticas como a justiça, a saúde, a educação e a habitação.
– Isolamento político do populismo antissistema, reduzindo o espaço de crescimento da radicalização.
– Maioria constitucional de 2/3, permitindo rever normas fundamentais da Constituição, há muito identificadas como desajustadas à realidade contemporânea.
1. Justiça
Portugal tem um sistema judicial em que é, por vezes, muitas vezes, uma forma de negação da própria justiça. É necessário rever os estatutos das magistraturas, reorganizar os tribunais, e garantir mecanismos de responsabilidade e eficiência. Só com estabilidade política e coragem legislativa se poderá avançar com uma reforma profunda da justiça penal, civil e administrativa, protegendo a independência, mas assegurando resultados.
2. Saúde
O SNS vive sob pressão crónica. A escassez de profissionais, a degradação das infraestruturas, a desorganização dos cuidados estão a gerar desigualdades no acesso e perda de confiança no sistema. Um pacto político que assegure investimento plurianual, reorganização territorial e modernização tecnológica é urgente só possível com apoio parlamentar largo.
3. Educação
A escola pública enfrenta uma crise silenciosa: envelhecimento docente, burocratização excessiva e degradação da autoridade pedagógica. O país precisa de uma nova visão para a educação pública, que valorize os professores, atualize os currículos e reforce a literacia científica e digital.
4. Habitação
Os jovens e a classe média vivem uma emergência habitacional. Não há futuro económico sem um mercado de habitação acessível, regulado e funcional. Um acordo entre os partidos centrais permitiria implementar uma estratégia nacional plurianual para habitação, integrando setor público, autarquias e iniciativa privada.
Podem dizer que tudo isto é uma utopia, mas no momento em que os lideres partidários colocarem o país acima das suas vaidades pessoais e no momento em que os eleitores deixarem de olhar para os partidos políticos da mesma forma que olham para os clubes de futebol então, nesse dia, a utopia torna-se real.
A ascensão do Chega é um fenómeno que não pode ser ignorado nem caricaturado. Resulta do descontentamento real, da frustração social e da perceção de impunidade. Mas a solução não está em ceder ao populismo nem em ostracizá-lo retoricamente, está em governar com resultados, combater a desigualdade com políticas públicas eficazes, e restabelecer a confiança dos cidadãos no sistema democrático.
Só um governo forte, estável e reformista conseguirá responder a esta ameaça com autoridade democrática. Fragilidade, hesitação ou pactos oportunistas com os extremos apenas acelerarão a erosão da democracia, a erosão do país e o descalabro futuro.
O país não precisa de unanimismo. Precisa de coragem institucional e maturidade democrática. Um Bloco Central bem negociado, transparente e com objetivos definidos, pode ser um instrumento de reconstrução da confiança política. Não se trata de fundir partidos, mas de convergir em torno do essencial, preservando as diferenças em tudo o que for acessório.
É tempo de encarar os próximos quatro anos como um ciclo de reconstrução estratégica, que prepare o país para a década de 2030, com estabilidade, ambição e reformas.
Portugal está diante de uma escolha histórica: repetir os erros de um passado recente, feito de promessas fáceis e crises permanentes, ou ousar uma solução corajosa, capaz de resgatar o país do impasse político e abrir um novo ciclo de prosperidade, justiça social e confiança nas instituições.
O país não precisa de vencedores eleitorais frágeis, mas de líderes à altura do tempo histórico que enfrentam. A pergunta é simples. Estarão PS e PSD dispostos a pôr Portugal primeiro?
Jacinto Furtado
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