“…caso tivesse 100 milhões de euros para distribuir, entregá-los-ia a Belmiro de Azevedo – que com eles poderia fazer num ano outros 100 milhões (passe o exagero). Se, inversamente, entregasse 1 milhão de euros a 100 pobres, ao fim do mesmo tempo o dinheiro teria desaparecido e eles estariam tão pobres como antes e muito mais infelizes”
Crónica de José António Saraiva no semanário “Sol”, 01/01/2015
Estas falácias são engraçadas. O Belmiro é apenas um dos muitos ricos portugueses! Quantos deles já foram à falência ou só não foram porque os seus ascendentes (os papás, a família) lhes deixaram um negócio estruturado?
Belmiro é um caso raro de alguém que, de uma pequena fortuna, fez uma fortuna gigantesca. Mas é um em centenas. A maior parte dos nossos ricos já nascem ricos e mesmo assim, alguns, conseguem perder tudo! Quantos serão? Quantos BPN, BIC, BCP, BES? Porventura, o Belmiro é um caso mais raro de “efeito multiplicador” do que os ganhadores de euromilhões “desmultiplicadores” de euros? Sabe lá o Saraiva, ou eu, ou qualquer um de vocês quantos dos que ganham ao jogo acabam por multiplicar fortuna e até, porventura, a criar postos de trabalho em empresas de sucesso? O Saraiva não sabe e portanto não deveria fazer afirmações com base em suposições.
Todas as semanas são criados milionários no Totoloto. Ele apresenta dois casos na sua crónica (eu li a crónica toda!) em centenas, milhares nos últimos anos!!! Devem ser raros. Tão raros que são notícia! Claro que não há notícias de pré-Belmiros que vão à falência. A não ser que sejam bancos ou empresas já muito grandes. E mesmo assim, há ou não há empresas gigantes que falem todos os dias, no mundo? Nunca leram essas notícias, de despedimentos em massa de Belmirozinhos de todo o mundo?! Já para não falar de bancos e só por cá são quatro!
Haveria portanto que calcular percentagens, rácios! Claro que dá muito trabalho e mais vale portanto mandar umas bocas, como faz o senhor Saraiva. Pelo menos leva palmas dos apaniguados do regime para quem a culpa da crise é dos pobres e da depauperada classe média que nos últimos anos sofreu ataques inéditos.
E o Saraiva esquece outra coisa: o Belmiro, que se fez com as próprias mãos – filho de carpinteiro, que teve a sorte de ser adotado por um tio, que pagou os estudos com os salários próprios, só se fez quem é porque teve com quê! E a sua oportunidade foi a Revolução de 1974! Esse foi o seu Euromilhões, que lhe possibilitou tomar posse administrativa da SONAE no ano da Revolução, a custo zero.
Teve sorte, recorreu ao crédito, também teve mérito. Sem dúvida. Mas alguém (ou vários “alguéns”) lhe deu uma oportunidade. De pobre passou a rico. Ora é essa possibilidade (ainda que teórica) que Saraiva despreza: dar oportunidades a pobres. Ele acha que, a dar-se dinheiro, se deveria dar aos que já são ricos! Aos Belmiros crescidinhos. E aos filhos e netos deles. Que não tiveram trabalho nenhum para o juntar, como teve o pai e avô. Para ele, Saraiva, os que estão no sistema estão, os que não estão estivessem!
E nem lhe falem em milhares de pobres, milhões em todo o mundo, arrancados das garras da pobreza graças ao microcrédito. Alguns deles tornaram-se grandes empresários, quase Belmiros! Mas ele não quer saber. Urge arrancar aplausos dos militantes do populismo anti-pobre que se instalou na sociedade portuguesa.
[…] Continua… […]