Morreu Herberto Helder, o poeta dos poetas

777832O maior poeta português da segunda metade do século XX morreu aos 84 anos.

O poeta Herberto Helder morreu, aos 84 anos, na segunda-feira em Cascais. O poeta que nasceu em 1930 no Funchal morreu em casa. As causas da morte não foram reveladas. Era considerado o maior poeta português da segunda metade do século XX. A cerimónia fúnebre realiza-se na quarta-feira e vai ser reservada à família, segundo comunicado da Porto Editora.

No ano passado, em Junho, publicou A Morte Sem Mestre, pela chancela da Porto Editora — numa edição que incluía um CD com cinco poemas ditos pelo autor. Em 2013 havia publicado Servidões. Desde a publicação de A Faca Não Corta o Fogo, em 2008, tornou-se um caso de consenso crítico quase absoluto. Tal como os anteriores livros de Herberto Helder, A Morte Sem Mestre teve apenas uma edição, tendo esgotado rapidamente.

“Herberto Helder foi um poeta poderoso, a sua obra foi um centro de atracção e um horizonte em relação ao qual todos os seus contemporâneos tiveram de se situar. Como antes tinha acontecido com Fernando Pessoa, também houve um ‘efeito Herberto Helder’, diz ao PÚBLICO o crítico António Guerreiro.

Pouco depois de saber da notícia morte de Herberto Helder, a escritora Maria Velho da Costa estava visivelmente emocionada.” Morreu o maior poeta português depois de Luís de Camões”, disse ao PÚBLICO.” Não estava com ele há algum tempo, mas recebia todos os seus livros.” O último, A Morte Sem Mestre, “um longo poema, belíssimo”. E terminou com um quase pedido: “Se as minhas palavras tivessem alguma influência eu propunha um dia de luto nacional.”

“Quando morre um poeta com a dimensão de Herberto Helder o que sentimos é que não apenas morreu um poeta mas a poesia”, declarou ao PÚBLICO o também poeta madeirense José Tolentino Mendonça, falando de um luto difícil. “Nestes casos o luto torna-se insuportável e, ao mesmo tempo, este luto faz-nos perceber que Herberto Helder é imortal com a sua obra. Daqui a mil anos, se subsistir um falante de língua portuguesa a poesia de Herberto Helder subsistirá”.

Entre os muitos poemas do poeta que começou a ler na adolescência, Tolentino Mendonça lembra aquele que começa com o verso “Não sei como dizer-te que a minha voz te procura”. É o início do poema Tríptico, do livro A Colher na Boca, de 1961.

José Tolentino Mendonça lembra que começou muito novo a ler Herberto, e que nessa leitura esteve presente um facto biográfico, “o de também ele ter emergido no contexto insular, na Ilha da Madeira”. Isso, continua, “era um vínculo forte para um adolescente que começava também na poesia a procurar razões para a própria vida. E essa descoberta foi a primeira viagem.”

Sublinha a insularidade como um traço permanente na poesia de Herberto. Uma insularidade que no seu sentido “está talvez mergulhada a muitas léguas de profundidade do que é essa palavra. Não é uma dimensão muito explícita, mas ler Herberto Helder na Ilha da Madeira tem uma ressonância e uma vitalidade que não se esquece”, refere sublinhando um aspecto que considera marcante. “Quando se ouvia Herberto Helder falar, mesmo muitos anos depois de ter saído da ilha, continuava com a pronúncia de um habitante do Funchal. Era um funchalense claramente identificável. E isso era uma nota afectiva de grande impacto.”
Numa nota de pesar enviada às redacções, o secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, escreveu: “Poucos foram os que durante os últimos cem anos tanto fizeram pela construção da língua portuguesa e tão influentes foram na organização da linguagem poética contemporânea.” E acrescentou: “A sua concentração em torno do seu ofício, ignorando e recusando formas de espaço público para lá da sua escrita, são um dos sinais da sua determinação relativamente a um discurso sobre o seu trabalho e sobre a sua presença.”

Herberto Helder frequentou a Faculdade de Direito mas abandonou o curso para se inscrever em Filologia Românica, que também não terminou. Ao longo da vida colaborou em diversos jornais, entre os quais o Jornal de Letras e Artes e, em 1969, foi director literário da editorial Estampa. Foi também meteorologista na Madeira, delegado de propaganda de produtos farmacêuticos e redactor de publicidade em Lisboa. Frequentou o grupo do Café Gelo, formado por Mário Cesariny, Luiz Pacheco, Helder Macedo, João Vieira e António José Forte.

Em 1958 publicou o seu primeiro livro, O Amor em Visita. Nos anos seguintes viveu em França, Holanda e Bélgica, tendo vivido na clandestinidade em Antuérpia. Em 1960 regressou a Portugal e tornou-se encarregado das bibliotecas itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian. Foi para Angola em 1971, como repórter de guerra, sofreu um grave acidente e esteve hospitalizado três meses. Regressou a Lisboa e partiu novamente para os Estados Unidos, em 1973, ano em que publicou Poesia Toda. Regressaria a Portugal depois da Revolução de Abril, em 1975, para trabalhar na rádio e em revistas e foi editor da revista literária Nova.

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